terça-feira, 17 de abril de 2018

OS CURRICULA DISCREPANTES




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            Numa sociedade cada vez mais descaracterizada por enredos absurdos, que a desregulamentação dos mercados teima em balizar, submetendo tudo e todos aos ditames implacáveis do capitalismo desenfreado, neo-liberal, frio e indomável, quem mais sofre são já os velhos e as crianças. Mas, hoje, ocupar-nos-emos das crianças, nomeadamente no âmbito da questão educacional, tão malbaratada em nome de desígnios economicistas inconfessados e inconfessáveis, porque temos estado todos, nesta pobre e velha Europa, principalmente, quer queiramos quer não, ao serviço desse esquizóide monstro sem valia humanitária e civilizacional.

            Pensamos que concordarão connosco se lhes dissermos que, quanto mais preocupados (se calhar, angustiadamente apavorados) estivermos com os problemas inerentes à nossa segurança económica e financeira, ao nosso emprego ou falta dele, à indefinição do futuro, já para não falar de outro tipo de ameaças que pairam no horizonte, menos disponíveis nos encontraremos para fazer face às prementes necessidades dos nossos filhos e netos, não só no seio familiar, mas também em contexto escolar. É que as crianças têm sido deixadas a uma aflitiva deriva, em ambos os enquadramentos a que atrás se alude.

            Nesta conformidade, e porque os homens de amanhã começam, já hoje, prematuramente, a ser abandonados à sua sorte, verificamos que as motivações são distorcidas, os valores são deformados, os vícios distendidos, o convívio, de cariz narcisista e tautológico, não visa o enriquecimento relacional colectivo da juventude, mas tece-se antes nos teares virtuais da internet, da perniciosa ilusão fantasmagórica que a vacuidade televisiva nos despeja em cada uma das casas que já não a dispensam; ainda nas famigeradas e atrofiadoras consolas dos denominados jogos de vídeo.

            Cingindo-nos então às crianças, diremos não ser de espantar que este terrível pacote, de influência poderosíssima, consiga desviar, alienar esses seres em formação, tornando-os pouco sociáveis e nada saudáveis, porque de ocupações solitárias se trata; deveras inseguros, porque não canalizam nem dimensionam a sua afectividade no sentido do desenvolvimento da sua emocionalidade, interagindo vivencialmente com outras crianças da sua idade; problematicamente tensas, porque esbanjam horas a fio, especadas frente às máquinas, numa gestão de sensações disruptivas muito mal digeridas, pior estruturadas ou até mesmo heteroclitamente desconchavadas.

            Ademais, sempre que as crianças não recriam devidamente as suas emoções; quando não condimentam as suas energias e respectiva aplicação de forma socializante e harmónica, porque se encontram cativas de enredos e esquemas mercantis, alegadamente lúdicos ou tidos como diversão de efeitos mais que perniciosos, geram-se comportamentos desviantes na sua maneira de ser, na sua natural capacidade de dirigir a atenção para as coisas que realmente interessam, como é o caso das matérias curriculares de eleição, a exigir concentração e aprendizagem.

            Um destes tipos de desvio prende-se com aquilo a que Barkley (1990) designou como o “distúrbio hiperactivo de défice de atenção”, hoje cada vez mais comum, em maior ou menor grau, nas crianças que todos os dias demandam os aberrantes mega-agrupamentos.

            Trata-se de um tipo de perturbação que fere de “morte” a motivação, a atenção e a concentração, sendo estas as pricipais vertentes responsáveis pelo exercício do papel fundamental de acicate em todo o processo de aprendizagem activa das crianças, visto predispor afectivamente os meninos, através da curiosidade, do interesse, da participação, do empenhamento; funcionam afinal, quando em alta, sendo aquela, pelo contrário, susceptível de disfuncionalizar toda a ambiência lectiva, na sua vertente mais nobre – a do enquadramento ensino/aprendizagem –, quando em défice.

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