domingo, 16 de abril de 2017

O CASTIGO EDUCATIVO



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          No dia 15 de Março de 1994, vimos o nosso trabalho – Educar no Amor – ser publicado na revista do Ministério da Educação – Notícias da Educação. Adivinhava-se já, na sequência do refazer do nosso tecido social e do tipo de coesão que o animava, por força de uma renovada realidade histórico-filosófica de cariz democrático, uma gradual alteração das mentalidades, tendente a pôr de lado velhos preconceitos e conceitos, protagonismos e práticas ultrapassados, mormente no âmbito da massificação do ensino.

         Sabíamos que seria assim, mas alertámos para a importância de Educar no Amor, para que as coisas, neste campo, não fugissem, sobremaneira, ao controlo dos pais, caso a Educação dos rebentos fosse deixada ao acaso. A escola só vem depois. A tarefa dos progenitores exige um esforço redobrado, já que no seu tempo de crianças e jovens foram educados de forma deficiente, muitas vezes brutal, sado-masoquista, aniquiladora ou enfática, com castigos corporais violentos, tendo sido psicologicamente castrados, paralisados, recalcados ou tornados agressivos e agressores. Tudo isto, quer se queira, quer não, formatou a sua estrutura caracterial.

          Segundo tem sido referido por inúmeros autores consagrados, historicamente, o castigo educativo foi beber inspiração na arcaica sede de vingança, no primitivo exercício compensatório de represálias, na ancestral necessidade histérica de cultivar ritos mágicos sacramentais, enfim, a partir da hostilidade e da cólera. O castigo de que falamos não se pauta pela razão, mas sim pela afectividade doentia, de tonalidade inconsciente, que embriaga o educador e o leva a procurar um bode expiatório que possa ser humilhado, visando aplacar a ira do “ofendido”. Esta prática danifica o instinto de conservação e a auto-estima infantis. A mesma configura ainda um tipo de comportamento que reedita hoje, não obstante a realidade epistemológica actual, a lógica dos povos primitivos, já que os mecanismos inconscientes que os motivam são intemporais.

         Tratando-se de uma matéria tão densa, complexa e profunda como o é a do castigo educativo, passaremos a focar agora, no enquadramento do presente escrito, um ou outro aspecto de maior importância, relêvo e recorrência no quotidiano das famílias, aquando do primeiro esboço (entre os dois, três anos e os cinco) de afirmação pessoal da criança – delimitação do Eu e início de integração social, através de uma forte oposição, teimosia (personalidade impositiva); este fenómeno, conforme a reacção parental – justa ou persecutória –, pode gerar uma terrível angústia, mais teimosia e grande ambivalência mesclada de ódio mal contido. Pais existem que chegam ao ponto de recriar espessos dramalhões pseudo-educativos onde impera a solenidade sado-masoquista, pateticamente mórbida, fatal para a sensibilidade e a consciência da criança, porque induz o esboroar da personalidade e o amestramento lacaio dos comportamentos, afastando o ser da dignidade humana.

            Estas práticas vão deteriorando a formação do carácter, da vontade, da consciência, ao mesmo tempo que precipitam, num clima crescente de angústia insuportável, a síndroma da culpabilidade e do abandono moral, da insegurança e da perda de amor-próprio. Ao invés, pelo jogo e pela actividade orientada pelo adulto equilibrado, as pulsões instintivas podem ser convertidas saudavelmente, também na consideração e no respeito dos que com a criança interagem. Importa não esquecer a complexidade da personalidade psíquica infantil.


         E concluímos com um alerta urgente, antes de passar ao segundo escrito sobre a presente temática: face a um ser em formação, a falta de respeito, a ignorância e a estupidez de progenitores ou educadores mentalmente infectados podem levá-lo à autodestruição ou à destruição dos outros, pelo acumular de tensões, de angústias e de medos que podem desembocar, eventualmente no suicídio ou noutro tipo de tragédias deploráveis (violência doméstica, maus-tratos, perseguições, terror “educativo”, desamor, ciúmes, indiferença, usurpação de direitos relacionais, chantagem afectiva, etc.). Mas, lembrem-se sempre: Educar (também) não é Cruzar os Braços.

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